Em uma pequena cidade onde os dias se arrastavam monotonamente, havia uma biblioteca que parecia ter sido esquecida pelo tempo. As paredes desgastadas carregavam o peso de histórias não contadas, enquanto o cheiro de papel envelhecido invadia o ar, criando uma atmosfera mágica e nostálgica. Era nesse refúgio literário que Ana, uma jovem sonhadora, encontrava seu escape.
Ana não era uma garota comum. Entre as obrigações do dia a dia e as expectativas da sociedade, ela se sentia como uma gaivota presa em uma jaula de ferro. A escola, com suas lições enfadonhas, não a satisfazia. Seu verdadeiro desejo era viajar por terras desconhecidas, conhecer mundos diferentes e viver aventuras épicas. Mas, na rotina limitada da cidade, os sonhos pareciam escapar como água entre os dedos.
Foi em uma manhã ensolarada que Ana decidiu explorar os corredores da biblioteca. Enquanto percorria as estantes, seus dedos passeavam delicadamente sobre os lombos dos livros, sentindo as texturas e imaginando os mistérios que cada um guardava. Foi então que, em uma prateleira baixa e empoeirada, seus olhos se depararam com um volume encadernado em couro marrom, quase esquecida pelos leitores. O título, "Os mundos de Avalon", ria em letras douradas e cintilantes. Sem hesitar, tirou-o de seu abrigo e encontrou um lugar confortável em uma poltrona perto da janela.
Ali, página por página, Ana surpreendeu-se com as aventuras de guerreiros e magos, com reinos encantados e batalhas épicas. A cada parágrafo, a jovem se sentia mais leve, como se as palavras fossem asas que a tiravam do chão. Ela não apenas lia; ela vivia. Em sua mente, as paisagens se desenhavam vibrantes, as vozes dos personagens ressoavam e as emoções pulsavam como se fossem dela. O mundo da literatura tinha a capacidade de destruí-la, mas também a de reconstruí-la.
As semanas passaram e a jovem tornou-se uma visitante habitual da biblioteca, mergulhando em obras de diversos autores e diferentes épocas. Cada livro era uma nova porta se abrindo, uma nova possibilidade surgindo em sua vida. Ana percebia que, ao folhear aquelas páginas, suas correntes se quebravam, um elo por vez. O medo, a insegurança e as limitações impostas pela sociedade se tornavam apenas sombras distantes.
Certa vez, ao ler um soneto de Shakespeare, Ana percebeu que as palavras tinham o poder de expressar o que muitos não conseguiam. Ela compreendeu que a literatura, em sua essência, era um grito de liberdade. Através das histórias, dos poemas e das reflexões, ela encontrou sua voz. Inspirada, começou a escrever. Letras rabiscadas em cadernos, versos despontando de sua alma inquieta. Cada frase era uma libertação, uma entrega a si mesma.
Na simplicidade de sua cidade, Ana transformou seu mundo interior. Assim como os personagens que conheceu, ela não se limitou mais. Sua identidade nasceu da fusão entre suas experiências reais e os universos que a literatura lhe proporcionava. Com cada livro lido, sua visão de mundo se ampliava, e a expectativa de que a vida poderia oferecer algo além da rotina fazia seu coração pulsar mais forte.
E, ironicamente, ao quebrar as barreiras que a prendiam, Ana descobriu que a verdadeira liberdade não estava apenas em escapar da realidade, mas em transformar a realidade com suas próprias mãos. Hoje, ao olhar pela janela da biblioteca, ela vê o horizonte não como uma linha distante, mas como um convite a ser desbravado, onde a literatura, de mãos dadas com a imaginação, continua a libertá-la, página por página, palavra por palavra.
FONTE/CRÉDITOS: Vera Salbego
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