Como em outros capítulos dessa novela chamada Aprovação das Lei Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2, mais uma vez o Governo Federal ataca de forma deliberada o setor cultural brasileiro (e toda a sua cadeia econômica e produtiva).
Mesmo após a vitória histórica na sessão de derrubada dos vetos das Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2 – conquista que só foi possível graças à intensa mobilização e articulação da sociedade brasileira junto ao Congresso – o governo Bolsonaro, por meio de uma Medida Provisória (inconstitucional), adia a execução dos recursos para 2023 e 2024. Além do mais o conteúdo desta MP ameaça o caráter obrigatório da execução dos recursos dessas leis. De acordo com a MP 1135/2022, a execução dos recursos da Lei Paulo Gustavo passa para 2023, e da Lei Aldir Blanc 2 passa para 2024. Pela medida do Governo Federal, não haverá mais recursos em 2022, e os 3,8 bilhões da Paulo Gustavo, assim como os 3 bilhões da Lei Aldir Blanc 2 podem ser interpretados como um "teto", e não mais como um investimento obrigatório, conforme prevê o texto das Leis aprovadas.
Como foi aprovado e como fica após a MP do Governo Federal
Como já foi explicado nas colunas Lei Paulo Gustavo: defender a cultura é um ato de resistência, Uma vitória para o Brasil, A Cultura da Miséria, A Cultura venceu a truculência e Lei Paulo Gustavo: fiquem ligados nos próximos capítulos, a Lei Paulo Gustavo, sancionada em julho deste ano, nasceu com o intuito de fomentar o setor cultural e atenuar os efeitos econômicos da pandemia no setor.
A contar da data de promulgação da lei, o Governo Federal teria “no máximo” 90 dias para providenciar os repasses para estados e municípios. Sendo assim, esse prazo se encerrará no início de outubro.
Para deixar ainda mais claro o objetivo desta MP, o texto revoga o trecho da lei que determina prazo original de pagamento, adiando os repasses, sem especificar o mês, apenas para o ano de 2023.
Além disso, esta MP modifica drasticamente o texto original, retirando o caráter impositivo da lei. O texto que anteriormente dizia “A União entregará”, sinalizando um compromisso formal, agora desconversa buscando guarida na expressão vacilante “fica a União autorizada”. Esta simples alteração textual isenta o governo de obrigações legais deixando-o apenas autorizado a fazer os repasses aos estados e municípios. Para deixar mais robusto este combo de maldades governamentais, o valor dos repasses deixa de ser um valor fixo e fica à mercê das “disponibilidades orçamentárias e financeiras de cada exercício”.
Como não poderia ser diferente, esses ataques em forma de alterações também se aplicam à Lei Aldir Blanc 2. Igualmente aprovada para suprir a carência emergencial do setor cultural e artístico na pandemia, esta lei prevê, durante cinco anos, repasse anual de R$ 3 bilhões aos governos estaduais e municipais, recursos estes que deverão ser aplicados para o financiamento de iniciativas culturais.
Pelo texto original, aprovado pelo Congresso, os repasses deveriam começar já em 2023, entretanto após a desastrosa MP, esse prazo foi adiado apenas para o ano 2024, sem especificar mês.
A verdade é que, com essa MP, Bolsonaro confiscou os repasses, interferindo no legislativo e podendo prejudicar milhares de trabalhadores da cultura, setor que emprega cerca de 5 milhões de pessoas.
Depois de publicar essa MP fugindo da obrigação de pagar os R$ 3,86 bilhões da Lei Paulo Gustavo em 2022, o governo encaminhou ao Congresso uma proposta de Orçamento (PLOA) reservando apenas R$ 300 milhões para o socorro ao setor cultural em 2023.
Correspondendo a apenas 8% do que foi aprovado pelo Congresso, para completar o pacote de horrores, os recursos para Lei Paulo Gustavo no orçamento de 2023 foram parar na rubrica das “emendas do relator”. Na prática a destinação destes recursos cabem ao relator-geral do orçamento, cabendo ao governo apenas sugerir a destinação do dinheiro.
Essa MP busca abrir espaço no orçamento de 2022, podendo chegar ao montante de 5,66 bilhões. Nas exposições dos motivos da publicação da MP, o governo cita de forma explicita os R$ 12,7 bilhões em despesas do Orçamento de 2022 que estão bloqueados. Deste montante, R$ 8 bilhões são destinados às polêmicas “emendas do relator”.
Esta manobra atende ao pedido do atual presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas-AL), principal líder do tão famoso Centrão no Congresso. O objetivo é liberar mais recursos para o mal falado “orçamento secreto” – apelido dado devido à falta de transparência e isonomia sobre a divisão e destinação dos recursos provenientes das tais “emendas do relator”.
Para o líder da minoria no Senado, Jean Paul Prates (PT-RN), existe uma “absoluta conexão” entre a edição das medidas provisórias e o desbloqueio de recursos do chamado “orçamento secreto”.
A Medida Provisória terá ainda que ser apreciada pelo Congresso Nacional. A Deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) afirmou em vídeo que irá solicitar ao presidente do Congresso Nacional, Senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a devolução imediata desta MP, “dado ao adiamento e ameaça ao caráter obrigatório e vinculante da execução integral dos recursos previstos nas Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2”.
Feghali afirma que irá solicitar ao presidente do Congresso Nacional a devolução da medida publicada pelo Governo Federal.
A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, determinou, na quinta-feira (01/09), que o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), se manifestem com urgência a respeito da medida provisória que adiou os pagamentos da Lei Aldir Blanc e da Lei Paulo Gustavo.
“Determino que sejam requisitadas, com urgência e prioridade, informações ao Presidente da República e ao Presidente do Congresso Nacional, a serem prestadas no prazo máximo e improrrogável de cinco dias”, decidiu a ministra.
Agora nos resta aguardar os próximos capítulos desta novela que, mais do que qualquer outra coisa, serve para desnudar o caráter perverso deste governo marcado pelo combate ao setor cultural e seus trabalhadores.
O setor cultural continua mobilizado e seus trabalhadores (com o apoio e articulação de governadores, prefeitos e secretários de cultura) seguem pressionando os congressistas para que o conteúdo aprovado seja levado à prática ainda em 2022.
Em breve veremos por que caminho esse enredo segue.
O capiroto do Planalto continua esperneando e cuspindo fogo, mas logo esse inferno acaba e a Cultura voltará a respirar sem todo esse cheiro de enxofre e mofo.
Quem (sobre)viver verá!
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